O calendário indicava 18 de Dezembro. As crianças faziam bonecos, jogavam, divertiam-se, mas os adultos perguntavam-se: “ Será que este terrível nevão não acaba tão cedo?!” Realmente a paisagem era branca, branca; fria e branca, com caminhos marcados com pegadas de pessoas e animais e de longe a longe uma telha vermelha de uma casa mais alta ou uma mancha verde de um pinheiro bravo espreitavam por entre a neve.
Sentado no sofá, ao lado da lareira, o Luís falava ao telemóvel:
- … acredita, este ano o meu pai e eu é que vamos preparar a consoada. Vamos cozinhar o bacalhau, cozer as batatas e as couves e fazer rabanadas…não te acreditas mas é verdade… a minha mãe e a minha avó vão ficar na sala a ver televisão … ah!, Ah! Divertido não achas?
Toc, toc… alguém bateu à porta.
- Com quem estavas a falar, Luís? – perguntou a mãe
-É com o meu amigo Filipe que vive na ASAS.
- Não queres convidá-lo para vir passar a tarde contigo?
- Claro, eu adoraria! – respondeu o Luís entusiasmado – mas mãe não te esqueças, tens que ser tu a telefonar para pedires autorização à directora.
A Assistente Social autorizou-o a sair, pois conhecia muito bem a mãe do Luís. Os dois rapazes brincaram na neve fria, fresca e fofa como algodão até à hora do lanche. Acabaram de lanchar e o Filipe teve de ir para casa.
À noite, durante o jantar, o Luís ganhou coragem e contou o seu sonho. Contou que as tardes mais divertidas eram aquelas em que o Filipe estava lá em casa, que os fins-de-semana sem ele eram muito aborrecidos, passava o dia todo no computador ou a ver televisão e a casa ficava triste, parecia uma casa habitada pelo silêncio. Os dias de festa eram poucos animados, só havia adultos e conversas sérias, apesar de algumas brincadeiras da mãe…
No dia seguinte, Luís perguntou à mãe se o Filipe podia passar o Natal lá em casa, assim era mais um homem para ajudar. A mãe concordou, mas era preciso pedir aos pais de acolhimento do Filipe, já que o Natal era um dia para a família.
Na segunda-feira, na escola, o Luís estava ansioso por contar a novidade ao Filipe. É evidente que o Filipe também gostou da ideia.
O pior veio à noite. O Filipe não ia poder passar o Natal lá em casa, não por causa dos pais porque, afinal, o Filipe é órfão de pai e mãe (morreram os dois com SIDA há dois anos), mas porque há uma família de acolhimento que costuma levar o Filipe nas férias para casa deles. Esta família é muito especial, são estes senhores que pagam a educação do Filipe.
Não imaginam como ficou o Luís quando soube. Fechou-se no quarto e pensou na sua triste vida de filho único, «Quem me dera ter um irmão, que triste não ter ninguém! Mais um Natal de adultos! Afinal o Natal é para as crianças, mas a prenda que eu mais queria nunca a vou ter!»
Como de costume a família Silva veio buscar o Filipe à instituição ASAS. Eles estavam diferentes, mais felizes, e, por isso, o Filipe estranhou. Quando chegaram a casa, o Filipe telefonou ao Luís:
- Olha Luís, já cheguei a casa dos meus pais adoptivos! É muito grande!
- Ainda bem que gostas da casa – disse o Luís.
- Mas eles estavam um pouco esquisitos.
- Esquisitos como?
- Parecia que tinham uma certa coisa para me contar.
- Mas isso não interessa agora, o que interessa é que tu estás feliz!
- Pois é !
- E tu estás bem?
- Sim.
- Pronto, até amanhã. Adeus.
- Amanhã liga o PC às dez. Adeus.
Decidiram que apesar de estarem longe um do outro podiam falar através do computador. Todos os dias o Filipe falava com o Luís para lhe contar as novidades que lá se passavam. Assim nunca se sentiam tristes, nem sozinhos. Como o Luís e o Filipe estavam sempre a falar um com o outro, a semana passara rapidamente.
O Luís entristecia por o Natal estar a chegar e ele estar sozinho, pois seria novamente uma noite aborrecida, de adultos, como nos Natais passados.
Era véspera de Natal, e como os dois amigos estavam atarefados não falaram um com o outro durante todo o dia. O Luís, como tinha dito ao Filipe, estava a ajudar o pai com os cozinhados. A mãe só ajudara com as rabanadas, pois o pai não as sabia fazer. No sofá, a mãe e a avó falavam baixinho. O Luís estava a achar estranho a mãe não estar a falar normalmente, parecia que estava a guardar um segredo ou uma surpresa. O jantar foi delicioso e a mãe elogiou ambos: o pai e o Luís. Logo a seguir a mãe questionou:
- O que é que gostavas de ter para o Natal, Luís?
- Um irmão era a prenda ideal! – respondeu o Luís.
- Se calhar até estás com sorte.
Foi então que a mãe deu a boa-nova ao Luís: ia ter um irmão!!!
O Luís, de tão contente que estava, foi logo contar ao Filipe. Telefonou-lhe para lhe dizer que a mãe estava à espera de um bebé. O Filipe ficou muito contente porque sabia que o seu amigo queria muito ter um irmão, mas o Filipe também tinha uma novidade para dar ao seu amigo. Anunciou-lhe que ia ser adoptado pela família Silva que o levava para casa em todas as férias. A família de acolhimento passaria a ser a sua verdadeira família. Apesar de satisfeito, o Luís notou alguma tristeza no tom de voz do Filipe e questionou:
- O que se passa contigo?
- Estive a pensar que gostava de partilhar esta alegria com os meus amigos da instituição!
- Ah!!! Pois é, tens razão.
- O que é que eu faço?
- Hum … Deixa-me pensar!
- E se nós passássemos o resto da noite de Natal na instituição com os teus amigos! O que me dizes? – interrogou o Luís.
- Até pode ser. Vou já sugerir isso ao Sr. Silva … ao meu pai.
- Claro!!! – disse o Luís.
Falaram com os respectivos pais e a resposta foi afirmativa.
Os pais do Luís acrescentaram:
- Temos de avisar a directora da ASAS.
- Está bem – respondeu, feliz, o Luís.
A directora concordou e pediu para eles levarem o bolo rei.
Em vez de um sonho foram realizados vários. Se calhar o Natal existe!
6ºA,B,C,D,E,F,
2009/2010
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